Ensinar língua portuguesa a adolescentes conectados – tem jeito?

Letramentos digitais, o caminho para conectar os jovens ao ensino de língua portuguesa

 

Separemos logo este título tão amplo – e complicado – em três ou quatro assuntos: ensinar língua portuguesa; a adolescentes; conectados. Três ou quatro? É que poderíamos começar, já de saída, separando o ensino e a língua portuguesa. Juntando os dois, no entanto, a luz recai sobre aquele algo do que posso falar, que é minha tarefa diária há anos… e nem por isso me parece resolvida e fluida. Menos ainda fácil. Mesmo na dificuldade, mesmo sem respostas, é importante trazer o tema à tona. Ou à tela.

 

Ensinar língua portuguesa

A julgar pela quantidade de livros que existem sobre o ensino de língua materna – e o ensino de línguas, em geral –, já é possível deduzir o tamanho da encrenca. Talvez a discussão que mais gere polêmicas nos cursos de formação de professores de língua portuguesa seja, ainda e há décadas, relacionada ao objeto dessas aulas. O que ensinar? Como ensinar? E como atrair o interesse de centenas de jovens?

 

Ensino gramática? Privilegio o ensino de leitura e escrita de um ponto de vista mais funcional ou interacional? Parto para a prática? Debato a teoria? No caso da língua portuguesa, o que devo considerar em relação aos falantes nativos que tenho em sala? Trabalho com gêneros discursivos? Incluo entre estes os gêneros orais? Ensinar português é ensinar a escrever? Que português ensinar, se “o português são dois”, como diria o poeta Drummond?
Encontrar estas respostas, ao menos parcialmente, é importante para o estabelecimento de concepções de língua, linguagem, ensino e mesmo para a visualização de objetivos mais definidos em relação à tarefa de ensinar português. No entanto, é fundamental saber que as concepções, os modos de ensinar e, principalmente, os de aprender mudam. Como lidar com essa fluidez?

 

 

Ensinar língua portuguesa aos adolescentes conectados

 

Como se define um adolescente? Parece claro que esta seja uma fase da vida de uma pessoa bastante definida por critérios biológicos, mas também por transições de caráter psicológico. Ampliando-se estas considerações, é preciso lembrar que professores lidam com dezenas dessas criaturas em salas geralmente fechadas, isto é, de onde nem um nem outros podem sair quando quiserem. A tarefa de ensinar português a turmas de adolescentes deve levar em conta aspectos sócio-históricos inescapáveis.

 

 

É fácil exemplificar com cenas quase inexistentes nos dias de hoje: fileiras organizadas, carteiras alinhadas e jovens obedientes, se é que já existiram mesmo, sumiram do horizonte – a despeito do saudosismo de alguns – para dar lugar a uma turma conversadeira, perguntadeira e até atrevida. É nesse ponto que entra a conexão digital. Não apenas por questões educacionais, mas também legais – está aí faz tempo do Estatuto da Criança e do Adolescente – e sociais as relações mudaram, assim como a maneira de lidar e perceber esses jovens. Palmatória hoje cheiraria a crime.

 

Adolescentes conectados

E que conexão é essa? Os adolescentes caçadores de Pokémons – a mais recente febre mundial via celulares – são, em parte, conectados à web, fãs de youtubers jovens como eles ou que fingem sê-lo, leitores de telas, consumidores de digitalidades as mais variadas, inclusive informados além da conta que a sala de aula poderia prever, ou mesmo desejar.

 

Ensinar língua portuguesa para essa turma soa como um desafio imenso. Como fazê-los se interessarem por classes de palavras? Ou por ortografia? Não é à toa que muitas pesquisas têm sido feitas buscando aproximar o universo digital das aulas e das escolas. Muitas vezes, essas tentativas se pautam pelo “interessar o aluno”, fisgá-lo com dispositivos que o atraiam, vestir de novidade velhos métodos, enfim. Sabe-se lá. Ainda vamos testando a efetividade de certas tentativas. Mas é certo que parte das preocupações com o ensino de línguas faz relações com modos de ensinar que se pareçam com jogos, vídeos, quizz, telas, operação com GPS, aparelhos móveis, câmeras fotográficas acopladas, projeções etc. Tudo para promover uma espécie de tradução de um  universo ao outro, isto é, a escola e a vida conectada, ao menos de grande parte dessa população de adolescentes no século XXI.

 

Ensinar língua portuguesa a adolescentes em tempos de internet e dispositivos móveis, ubíquos, na palma da mão é tarefa hercúlea, mas possível. Comece-se pedindo que a moçada pesquise o “hercúleo”, adjetivo para lá de mitológico, conhecido para alguns, inclusive porque são antenados em jogos e narratividades recentes, mas desconhecidos para outros. A tarefa do professor de língua está sempre aí nas brechas entre a linguagem e o mundo em que vivemos.

 

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