Literatura infantil inglesa x brasileira
Publicamos hoje um texto que valoriza a literatura brasileira, encarece o Brasil e põe nossa cultura em pé de igualdade, como deve ser, sem complexo de vira-latas, com a literatura mundial. O artigo foi originalmente publicado no blog “Brasileirinhos pelo mundo” [BPM Kids] e é por grande atenção de Ann Moeller, fundadora & editora chefe da plataforma colaborativa Brasileiras pelo Mundo e do BPM Kids, que obtivemos permissão para reproduzi-lo hoje no blog da Parábola Editorial. Agradecemos muito a Andrea D’Essen e a Ann Moeller a autorização e o gesto de amizade.
Literatura infantil inglesa x brasileira
Minha filha já estava totalmente adaptada na escola primária e parecia feliz. Mas, na minha cabeça, algumas coisas sobre a educação dela e a perda da identidade brasileira me preocupavam. À medida que o tempo ia passando, minha filha se aproximava mais e mais da cultura britânica... algo que, cá entre nós, nada mais era do que o esperado. Mas e o Pedro Álvares Cabral? E a Emília e a Narizinho? E a Turma da Mônica? Eu achava que já estava na hora de o Willy Wonka visitar o Sítio do Pica-Pau Amarelo!
Minha filha tem o cabelo loiro escuro, é clarinha, e se você não souber de onde ela vem, pode achar que ela é inglesa. Mas ela jamais gostou que achassem que ela era qualquer coisa que não fosse brasileira. Aliás, sempre que pudesse, deixava claro que era brasileira e que falava português.
O “R” que soa como “H”
O nome dela, Rafaella, nunca deixou dúvidas de que ela era uma estrangeira no Reino Unido. Desde cedo, ela aprendeu a explicar o motivo pelo qual a chamávamos de Rafa (nunca quis mudar a pronúncia do próprio nome, sempre foi chamada de Rafa do jeito que pronunciamos no Brasil. Não é porque mudamos para a Inglaterra que agora a chamaríamos de Rafa com o R de red (cor vermelha em inglês). Ainda pequena, ela aprendeu que em português o som do R era o mesmo que o do H em inglês e era assim que explicava a escrita e a pronúncia do seu nome a quem perguntasse. Mas é óbvio que isso não impediu que os convites para festas viessem muitas vezes endereçados a Haffa.
No nosso primeiro ano aqui, não insisti muito em ler histórias em português, pois apesar de falarmos a língua em casa, ela precisava aprender inglês rápido e de maneira eficiente. Mas, depois, chegou a momento de estabelecer um equilíbrio entre as duas culturas.
A introdução aos clássicos da língua inglesa
Na escola, ela foi apresentada aos grandes autores infantis da língua inglesa: Roal Dahl, Dr. Seuss, Beatrix Potter, Lewis Carroll. Mergulhamos juntas nos clássicos A Fantástica Fábrica de Chocolate, Matilda, Alice no País das Maravilhas, Peter Rabbit, O Gato da Cartola. Descobrimos outros também muito divertidos como The Very Hungry Caterpillar, The Gruffallo,The Tiger Who Came to Tea, The Adventures of Captain Underpants, Gangsta Grannye a coleção favorita da minha filha, Mog Time Treasure, que conta as peripécias de uma gata muito simpática. Para explorar mais livros que toda criança deve ler antes de deixar a escola primária, acesse este link: http://bit.ly/1hWkWoy.
Pra mim essa aventura foi super interessante. Foi diferente ler alguns desses livros com ela num outro ambiente, imersa numa outra cultura. A rotina de contar histórias na hora de dormir era uma delícia! Mas tinha chegado a vez de contar histórias em português, falar das lendas e dos folclores brasileiros, saber direito quem eram a Mônica, o Cebolinha, o Cascão e a Magali.
A revanche da cultura brasileira
Mais uma vez o bloco “Família Unida” entrou em ação e, em pouco tempo, começamos a receber as encomendas. O pai da Rafa mandou vários livros do Monteiro Lobato e gibis da turma da Mônica, minha mãe mandou Cecília Meirelles, Ziraldo, Ruth Rocha e Maria Clara Machado. Minha irmã mandou filmes como Tainá e O Castelo Rá-Tim-Bum. E eu já tinha trazido o CD de Os Saltimbancos e A Arca de Noé I e II. A munição estava pronta!
Com a leitura dos livros em português, o vocabulário dela expandiu, nós duas nos divertimos e eu sosseguei. Tinha certeza que o Brasil, de uma forma ou de outra, nunca ia sair de dentro da gente. Mas e o Pedro Álvares Cabral e a descoberta do Brasil? E o hino nacional?
Na primeira oportunidade que as crianças tiveram de escolher um país para fazer e apresentar um trabalho escolar a respeito dele, a Rafa logicamente escolheu o Brasil. Aprendeu direitinho sobre a capital do país, soube justificar as cores na bandeira nacional e outras coisas relevantes que explicou aos colegas. Fizemos brigadeiro e a supermãe aqui foi atrás de guaraná para levar no dia da apresentação. Sucesso total!
Tivemos muita sorte durante a escola primária, pois, num ano, a escola organizou uma apresentação de capoeira, num outro ano resolveu fazer um bloco de carnaval e a Copa do Mundo no Brasil foi exatamente durante o último ano da Rafa lá. Parecia que o universo estava a nosso favor: qualquer desculpa servia para falar do Brasil e isso foi superútil para nós duas. Ser brasileiras estava em alta!
Minha experiência mostrou que, mesmo morando fora do Brasil, ainda dá para manter a brasileirice das nossas crianças. A gente tem que dar um empurrão, mas lá na frente percebe que tudo valeu a pena. Ok, sei que vai ser difícil minha filha saber de cor o hino nacional, mas hoje, quando vejo minha filha adolescente ouvindo música brasileira que eu apresentei pra ela, meu coração se aquece.