o que você pode fazer com um diploma em linguistica

The Language Nerds

[https://ahtaitay.blogspot.com/p/blog-page.html]

Tradução: Marcos Marcionilo

 

 

 

Quando você diz a alguém: “Sou linguista”, a resposta geralmente é: “Quantas línguas você fala?” Quase sempre, as pessoas partem do princípio de que o trabalho de um[a] linguista é aprender tantas línguas quanto possível, quando, na verdade, não é bem disso que se trata. Então, tentemos dar fim a essa ideia equivocada de uma vez por todas.

 

Linguistas não são obrigados a aprenderem centenas de línguas, linguistas estão comprometidos em estudar como as línguas funcionam. E quando digo “língua”, estou me referindo à linguagem humana, um conceito guarda-chuva que incorpora todas as línguas faladas pelos humanos, inclusive pidgins, crioulos e línguas de sinais. Graças aos linguistas, o mundo é agora um lugar melhor, muitos problemas terríveis que subsistiram por séculos foram solucionados porque agora temos um melhor entendimento da linguagem e das questões a ela relacionadas.

 

 

“Linguistas estão comprometidos em estudar como as línguas funcionam”

 

 

Neste texto, vocês verão extensamente as contribuições dos linguistas ao mundo moderno. E também verão o grande desfavor que é limitar o trabalho do[a] linguista a apenas aprender línguas. 

 

Permitam-me dar apenas alguns exemplos antes de passar a um detalhamento mais específico.

 

O trabalho de um[a] linguista poderia implicar explorar a neurociência de como a linguagem funciona no cérebro;  a tipologia de como diferentes linguagens assumem funções semelhantes pelo uso de dispositivos formais diferentes, a psicologia do desenvolvimento de como a aquisição de linguagem pelas crianças funciona ou de como ela pode dar errado; como a habilidade linguística deixa de funcionar na afasia, no Alzheimer ou por conta de alguma outra disfunção; como a linguagem funciona como uma interface humano-computador bidirecional; como uma língua funciona quando aprendida posteriormente na vida em situações de ensino em sala de aula; como as línguas mudam; como as línguas definem variadas identidades sociais; como as línguas funcionam em outras profissões, incluindo a política, o direito e  a execução penal e como alguém pode fazer línguas novas, funcionalmente construídas (sim! Há linguistas que criaram o Dothraki e o Valiriano).

 

Agora, deixe-me pôr as coisas em perspectiva para você. Há muitas coisas que você pode fazer com linguística, sendo pago por elas. Vejamos juntos essa lista:

 

 

Pesquisa

 

AcademiaHá linguistas que ensinam e pesquisam em departamentos universitários de linguística, assim como de psicologia, fonoaudiologia, ciência cognitiva e em departamentos de ciências da computação.  A maioria das grandes universidades mantêm departamentos de linguística, mas muitas universidades não, um fato desanimador para os[as] linguistas quando se pensa uma disciplina como a psicologia, por exemplo.

 

Pesquisador[a]: Além de pesquisar na universidade, há outras organizações que apoiam a pesquisa linguística, incluindo o NHI (ex.: National Institude on Deafness and Other Communication Disorders), o NSF, DARPA e o Department of Veterans Affairs. Na Europa, há lugares como o Instituto Max Planck de Psicolonguística, o CNRS e o BCBL – Basque Center on Cognition, BCBL - Basque Center on Cognition, Brain and Language, que subvencionam pesquisa linguística com muito maior generosidade do que os Estados Unidos.

 

Pesquisa empresarial: Em alguma medida, muitas empresas (Google, Microsoft, Yahoo!) investem em pesquisa linguística básica. Muito dessa pesquisa se concentra em coisas como NLP/NLU (ver abaixo). Raytheon também mantém uma divisão de pesquisa, a Speech Tech (Speech, Language & Multimedia).

 

Lexicografia: Linguistas são também aquele[a]s que determinam o que entra para o dicionário e o que fica de fora. Literalmente preocupados com a aceitação de coisas tão simples quanto um intensificador. Você pode culpar um linguista, mas saiba que toda decisão é tomada com base em um caminhão de pesquisa.

 

 

Entretenimento

 

Hollywood: Surpreendentemente, existem muitas maneiras de linguistas ganharem dinheiro em Hollywood, maneiras que não envolvem ser garçons ou garçonetes. Há um punhado de gente (e sua sociedade, a Language Creation Society) que cria línguas para cinemas e shows como Avatar e Game of Thrones, mas existem também os professores de dialetos e os consultores linguísticos para shows que pretendam manter, em alguma medida, algum cuidado histórico com a língua falada em determinado momento.

 

Comentarista linguístico: muitos grandes jornais têm uma espécie de coluna sobre linguagem, algumas revistas também. Linguistas ou pseudolinguistas (por exemplo, William Safire) escrevem essas colunas, geralmente para o gozo dos viciados em gramática prescritiva. Ainda temos gente como  Deborah Tannen, que também é da academia e que, a partir de um lugar de destaque, fala para grandes públicos sobre nosso modo de falar uns aos outros.

 

 

Tecnologia

 

LocalizaçãoDiante do fato de as empresas irem se tornando cada vez mais globais, mais e mais expertise se faz necessária para tornar algum produto adequado para determinado país, capaz de ser transferido para outra língua e cultura. Muitas empresas, incluindo Google (por exemplo: Google Localization Specialist Jobs) contratam linguistas para ajudá-las a adensarem sua presença na internet em algum novo locale.

 

Processamento de linguagem naturalInteragimos muito com computadores nesses nossos tempos. Seria incrível poder fazer isso apenas falando. Em algum momento não muito distante devemos ser capazes de fazê-lo. Aparentemente, o Xbox One logo disporá de uma interface capaz de entender a língua natural bastante sólida, e a Siri e o Google Glass também dependem desse tipo de tecnologia. Ela é frequentemente desenvolvida por meio de uma combinação de ciência da computação com linguística. Coisas como tradução automática também entram em cena aqui.

 

Análise semântica/Big Data. O que se diz no Twitter sobre o PRISM (programa de vigilância global da Agência de Segurança Nacional americana)? Como as pessoas que frequentam o Quora se sentem em relação a Justin Bieber (o cantor)? Para descobrir como passar um pente fino na vastíssima quantidade de big data criada com os dados da língua natural é preciso combinar ciência da computação, estatística e linguística. E dado que o próprio PRISM exige certa quantidade expressiva de sofisticação linguística – muito certamente a NSA está contratando (Intern Program at the National Security Agency)!

 

Gerenciamento de documentos. Atualmente nós temos uma ingente quantidade de documentos. Empresas têm muito mais. Os linguistas podem ajudar a criar sistemas automatizados que interpretem seus documentos, deem conta daquilo a que eles se referem e os organizem e recuperem quando necessário.

 

Testes de proficiência linguística. Há dois caminhos que você pode tomar aqui. Primeiro, há empresas que avaliam a proficiência linguística e, particularmente, há uma tendência a fazer esses testes a partir de bases telefônicas. Uma aplicação óbvia seria avaliar a proficiência em inglês e o sotaque de candidatos para um call center. Você também pode trabalhar na criação de testes que avaliem a habilidade de falantes nativos em sua língua materna. Empresas aqui incluem Pearson e ETS.

 

Linguística em outros campos

 

Linguística forenseHá muitos especialistas nesse campo. Joe Devneyé um exemplo (exemplo: For what legal cases have linguistics played a big role?). Linguistas podem ser chamados a atuar em diversas dimensões de um caso jurídico, desde interpretar a linguagem de contratos até identificar se alguém está bêbado baseado em sua voz.

 

 

Língua e cultura

 

Tradução. A tradução implica avaliar uma infinidade de sutilezas entre duas ou mais línguas para decidir como traduzir uma noutra. Serviços de tradução foram e são um bom negócio. Ainda estamos para ver em que medida eles serão transformados pela tecnologia e pela tradução automática. 

 

Revitalização e documentação linguísticas. Línguas estão morrendo, e morrendo rapidamente. Então, existe um mercado onde linguistas ajudam grupos – tribos indígenas, por exemplo – a revitalizarem e/ou documentarem suas línguas ameaçadas.

 

 

Língua e saúde

 

Patologias da fala e fonoaudiologia. Geralmente isso requer uma graduação específica em patologias da fala ou fonoaudiologia, mas não existe muita diferença entre esse campo e a linguística. De fato, muitos dos professores dos departamentos universitários de ciência da fala e da audição têm doutorados em linguística. Patologistas da fala podem trabalhar com crianças (muitos deles trabalham em escolas de educação báscia, por exemplo), com pacientes vítimas de afasia ou de acidentes vasculares cerebrais e idosos.

 

Aparelhos auditivos. Aparelhos auditivos são um grande negócio em países cuja população envelhece. Criar aparelhos auditivos cada vez melhores acarreta entender como os humanos percebem a fala, dado que os sons são aquilo com que as pessoas mais se preocupam. Linguistas fazem pesquisas para empresas de aparelhos auditivos, bem como para adaptá-los aos pacientes e assim por diante. Às vezes, alguma graduação especializada em fonoaudiologia se faz necessária.

 

Língua como ferramenta de diagnóstico. Um nicho específico com o qual quero concluir é justamente aquele que me parece uma área interessante e madura para ser explorada. O modo como você fala muda quando você sofre de Alzheimer, trauma cerebral e outros casos como depressão e esquizofrenia. Isso leva à necessidade de ferramentas poderosas para levantar diagnósticos preliminares sem a necessidade de uma consulta médica. Simplesmente falar em seu celular e ter um algoritmo escrito por um linguista pode indicar os próximos passos.

 

Certamente há mais possibilidades de aproveitamento de seu diploma. Se você se lembrar de alguma, por favor, registre-a nos comentários.

 

Obrigado por ler este artigo. Por favor, compartilhe-o com as pessoas que você considere público-alvo carente de explicação sobre os campos de trabalho para os linguistas.